terça-feira, 9 de setembro de 2008

Uma viagem do baralho - Parte I

Era o último dos dias de aulas noturnas naquela semana. A aura de expectativa pairava sobre dezenas de jovens mentes que adoram se auto-pronunciar "criativas". Tolos esperançosos, digo eu. O conteúdo acadêmico daquela sexta-feira marcante seria ignorado com louvor em prol de um bem maior: o clássico devaneio etílico disfarçado de capacitação profissional. Interesses em comum ocupariam o mesmo teto sob rodas dentro de alguns instantes. Publicitários ébrios e inconseqüentes fariam da BR-101 a sua festividade máxima daquele já finado semestre.

Pouco faltava para a partida do ônibus e os preparativos tinham que ser agilizados. Deslocamo-nos à drogaria mais próxima a fim de comprar a salvação de muitos boêmios descontrolados: o engov. Ao retornar, assentamo-nos em nossos lugares e observamos, de cima, casais apaixonados se despedindo, onde as partes que não embarcariam na cruzada clamavam por fidelidade. Partimos.

Ainda dentro dos limites geográficos de nossa cidade, abrimos garrafas do melhor vinho a cinco reais já criado, cultivado em campos largos na região sulina da nossa terra brasilis. Compartilhamos (ou tentamos compartilhar, não me recordo ao momento) alguns copos com algumas das donzelas simpatizantes que se encontravam próximas a nós. Degustamos e regozijamos com louvor o elixir sagrado de Baco, sentindo em poucos minutos o efeito inebriante como conseqüência. A ignição havia sido ativada, não havia mais retorno.

Conversas ainda comportadas, porém divertidas, eram a ordem no momento. Triálogos - e porque não quadriálogos ou pentálogos - sobre o injusto e falso mundo da publicidade e outros assuntos hoje dispensáveis fizeram a pauta por diversos minutos. Até que, uma parada em uma metrópole mudou totalmente o curso da viagem. Alguns dos viajantes carregavam em compartimentos secretos uma planta que fez parte de diversas civilizações antigas e proeminentes (não fosse a falácia física e brutal de colonizadores europeus). Hoje em dia, tal artifício para sair da realidade é marginalizado pela grande mídia, e até com um pouco de razão. O problema é que isso é mero interesse corporativo, mas não vem ao caso. Ao descermos do ônibus para saciar a nossa necessidade estomacal, tal iguaria foi consumida por diversos integrantes da expedição, resultando em insanidade instantânea.

Toneladas de tetraidrocanabinol haviam sido inaladas pelas jovens mentes de classe média. Risadas e momentos de descontração involuntários ocorriam simultaneamente com vários estudantes. O ônibus havia partido e todos lá estavam, aproveitando o máximo daquela ida inconseqüente. Rodas de improviso musical aconteciam, com ênfase no estilo afro-americano de rimas, e mesmo quem não detinha talento e experiência o suficiente para tal atividade participou com louvor. O tempo foi passando, porém não o efeito amortecedor das substâncias consumidas. Alguns dos usuários, por vezes, criavam momentos acidentais de discórdia, fazendo brincadeiras socialmente inaceitáveis para alguns dos viajantes, resultando em desavenças públicas e, como relatado, agressões físicas. É de conhecimento geral da trupe mochileira de que um dos indivíduos lesionou a testa de outrem devido a brincadeiras de cunho sexual. A brincadeira em questão não denotava intenções carnais, porém tal fato não foi compreendido pela vítima da peraltice. Professores se incubiram de apaziguar o ambiente e após alguns momentos tudo se demonstrava normalizado.

Aquele que proferiu brincadeiras sexuais acabou por exagerar na ingestão de bebidas alcoólicas, dando o popularmente chamado "PT". E não, amigos, não estamos falando do amado e odiado Partido dos Trabalhados, mas sim da "Perda total", onde alguém desaba em sua própria infelicidade física e despeja os resquícios nojentos de sua última janta no chão do ônibus em movimento. Porém aqui o problema era mais grave. O "perdido total" exauriu todo o conteúdo estomacal em sua própria indumentária, causando asco a todos os cidadãos de bem que circundavam o pobre rapaz. A noite havia acabado, pelo menos para ele.

Ao chegar a maior metrópole deste nosso estimado país, o "perdido" acordou com duas desagradáveis surpresas: além de perceber vômito fresco em sua única blusa, viu que o infeliz que o havia socado no meio da madrugada hibernava no acento ao seu lado. Não fosse o engov, o "perdido" chafurdaria em sua infeliz inconseqüência, porém graças à medicina milagrosa, ele saltitou vomitado e feliz em meio à sociedade estudantil publicitária de São Paulo, com as mais belas garotas o olhando e com professores reprovando tal atitude.

Era o início de um belíssimo final de semana.

Incubo o outro integrante deste blog a escrever a segunda parte desta viagem. Ou, quem sabe, um outro olhar sobre os acontecimentos acima.

Um comentário:

Rodrigo disse...

Sim, vou me preparar para tanto, mas é uma tarefa árdua e ingrata, caro blogueiro. Não sei se serei capaz de cumpri-la com devido apreço e zelo.